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matilda — 31 de março de 2017

QUANTAS MULHERES SOMOS?

No teatro, a atriz Ana Cristina Colla e a plateia estão juntos, no mesmo nível, sem palco. Sob um tapete bordado com uma caixa do divino, ela espera o público se acomodar em seus lugares. Seu corpo parado é a fronteira entre nós e as histórias a serem contadas.     Com um canto e com os toques na caixa, a linha fronteiriça começa a se quebrar. Aos poucos, nada nos separa e estamos todos juntos no mesmo barco, viajando pelo rio memória da atriz, passando por estações com narrativas, mulheres e corpos diferentes. Assim pode ser descrito o espetáculo SerEstando Mulheres, em que Cris narra e costura momentos de sua vida com os de sete mulheres que passaram pelo seu caminho em lugares e tempos distintos — sua mãe, Dona Maria, Maroquinha, Corpo Rua, Corpo Infância, Nataly e a Velha. Ao todo, foram mais de 20 anos de pesquisa para construir esse repertório feminino junto ao Lume Teatro de Campinas: “Quando o desejo brotou forte, de mapear um caminho percorrido, percebi que as corporeidades que mantiveram sua intensidade, mesmo com o passar dos anos, foram as femininas. Talvez contaminada pelo desenvolvimento de um olhar focado no feminino, do Encontro e Festival de Teatro Feito por Mulheres Vértice Brasil, onde a  questão do fazer teatral feito por mulheres é amplamente discutido. Talvez por ter me tornado mãe e assim me ressignificado enquanto filha e esse cruzamento com a atriz ter potencializado os diferentes territórios por onde nós, mulheres, circulamos e as diferentes sensibilidades que cada um deles nos exige. Talvez por me ver espelhada em cada uma delas, mulheres observadas e recriadas por mim ou construídas no fervor da sala de trabalho. Talvez pelo colorido tão singular de cada uma, da penumbra da velha acamada, da cor rosa da menina velha com rugas, do ocre cru e intenso das ruas, do pink fútil da loira Nataly. Quantas mulheres somos! E pelo prazer de me ver vestida de todas elas”.     O espetáculo mescla várias técnicas, de mimese corpórea a dança pessoal, passando por butô e clown. Mas o resultado vai muito além: ele nos leva a pensar que o corpo de uma artista é resultado não só de uma metodologia de trabalho, mas também de fragmentos de vida que refletem o momento em que foram gestados. Afinal, existe separação entre o que é real e o que é ficção? Nosso corpo é a separação das memórias do que aconteceu no dia a dia e do que criamos no imaterial, como uma leitura, um vídeo ou até mesmo uma imitação? Ou somos uma composição, uma mistura disso tudo? Cris dá uma pista: “A memória é o elemento comum entre todas elas [as histórias]. Seja a memória do encontro, da imagem do outro fora de mim, do espaço à volta, seja a atualização de fragmentos de memória, vivido ou imaginado. Memória enquanto duração, de um presente que se acumula num passado, e que se torna novamente presente carregado de todo o passado anterior, numa atualização do vivido no presente. A memória como detonador de poéticas.” Difícil escrever sobre isso quando todas as sensações estão no corpo. Talvez seja mais fácil dançar do que escrever. Será? “É uma colcha de retalhos, pedaços conhecidos e sempre ressignificados, espalhados por diversos espetáculos”, resume Cris.   Abaixo, o teaser do espetáculo:

Ficha Técnica:

Criação e direção: Fernando Villar e Ana Cristina Colla Atuação: Ana Cristina Colla Músicas: Rodrigo Cariranha, Robert Medzo e Greg Slivar Concepção de Figurino: Silvana Nascimento Concepção de luz: Maria Emília Cunha Alves

Acompanhe a página do Lume Teatro no Facebook para saber quando a peça estará em cartaz.