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matilda — 2 de fevereiro de 2018

OS RITMOS DE IEMANJÁ

“Olha o canto da sereia

lalaó, oquê, ialoá

Em noite de lua cheia

Ouço a sereia cantar”

                                                                           (Lenda das Sereias, Rainha do Mar)

A lenda da figura feminina que habita as águas e encanta com sua voz e sua beleza está presente em diferentes culturas, em todo o Brasil e também no mundo. Na tradição indígena, por exemplo, ela aparece como Iara, sereia do rio Amazonas que devora os viajantes, e Janaína, índia dos tempos da colonização que é engravidada pelos Portugueses e se atira ao mar, se tornando um espírito de proteção dos nativos contra os colonos.   Iemanjá, orixá do candomblé, umbanda e outras religiões de matrizes africanas, também é representada por diversos músicos como uma Sereia do Mar, fundindo-se a todos esses mitos da cultura popular, o que a torna uma das divindades mais conhecidas e adoradas de todo o país. Dorival Caymmi, Vinícius de Moraes, Clara Nunes, Marisa Monte, Maria Bethânia… não são poucos os artistas que emprestaram sua voz para que a Deusa das Águas pudesse encantar multidões.

“Se você quiser amar

Se você quiser amor

Vem comigo a Salvador

Para ouvir lemanjá”

                                              (Canto de Iemanjá)

 E se nos palcos Inaê é eternizada por grandes nomes da música brasileira, longe dos holofotes as vibrações da Mãe d’Água também ecoam e tocam as mais diferentes pessoas, como é o caso de Jean Marcelo de Sorocaba/SP, adepto do Xamanismo: “Me tornei devoto de Iemanjá após sentir sua energia por meio de uma música durante um ritual com a sagrada medicina da ayahuasca. Senti sua força e visualizei seu manto azul me cobrindo e me enchendo de paz e amor”. Roberta T’ Yemanja, yawô filha de Iemanjá de Olinda/PE, explica que essa relação com a música é uma caraterística de todos os orixás: “A música e dança são como um fio condutor para as religiões de matriz africana. O orixá gosta de felicidade, de axé!”. O axé, essa energia transformada em alegria, também invade as avenidas durante o carnaval, em forma de samba-enredo de diversas escolas de samba do Rio de Janeiro e também em São Paulo. Em 1976 a Império Serrano homenageou Iemanjá com o famoso samba imortalizado por Marisa Monte, “Lenda das Sereias, Rainha do Mar”, e este ano será a vez da escola Nenê de Vila Matilde com o tema “Epopeia de uma Deusa Africana”.     No carnaval de rua as vibrações dos orixás também são sentidas através das músicas e danças que fascinam quem passa. No bloco Ilú Obá de Min, grupo composto apenas por mulheres que promove as culturas africanas e afro-brasileiras, os orixás são representados no xirê, apresentação de abertura inspirada no ritual do candomblé. Por meio da encenação, novas pessoas também conhecem e se conectam com a Princesa de Aiocá. Regina dos Santos, integrante do bloco, possui uma história muito forte de ligação com a Rainha do Mar através da música: “Teve uma época que me conectei bastante com ela. Ganhei até um tambor que foi consagrado a ela numa praia. Um ocean drum (tambor do oceano). Muitas coisas vibravam na minha vida trazendo essa força, foi quando ganhei o álbum Mar de Sofia da Maria Bethânia, também indício dessa vibração na minha vida. Esse CD inteiro me marcou muito. Foi ouvindo ele que raspei meus dreads que mais tarde foram oferecidos a Iemanjá”.   Coincidência ou não, Iemanjá parece fazer jus a seu título de sereia, que seduz e maravilha a todos por meio da magia da música. Não à toa, milhares de fiéis, devotos e simples admiradores prestam suas homenagens neste dia 2 de fevereiro.

Odoyá!

 

*Iara, Janaína, Sereia do Mar, Deusa das Águas, Inaê, Mãe d’Água, Princesa de Aiocá e Rainha do Mar são todos nomes associados à Iemanjá pela cultura popular.

Crédito da imagem de destaque: Bloco Ilú Obá de Min/ Facebook