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matilda — 24 de maio de 2017

A CARA DOS NOVOS IMIGRANTES DA CIDADE DE SÃO PAULO

Quem costuma andar pelo centro de São Paulo já deve ter percebido a diversidade de línguas e sotaques que permeiam a área. O motivo é simples: a região é o principal destino dos novos imigrantes que vêm, principalmente, da África e da América Latina. Esse fluxo migratório recente já soma novos traços à cultura paulistana. No bairro da República, por exemplo, concentram-se pequenos ateliês e bancadas de roupas e adornos africanos de uma beleza impressionante. Do Arouche à Santa Ifigênia, pipocam restaurantes com culinárias bem variadas: em um passeio de fim de semana, é possível conhecer a culinária peruana, beber um drink camaronês e terminar se deliciando com um doce colombiano. Já no Brás, temos uma boa dimensão da representatividade e costumes da comunidade libanesa, que continua recebendo novos membros a cada dia. Foi um pouco dessa experiência tão rica que quisemos trazer aqui. Durante os meses de abril e maio, saímos pela região central para falar com pessoas que chegaram no Brasil nos últimos anos. Homens e mulheres que largaram seus países para encarar uma nova vida, cientes das dificuldades e do preconceito (mesmo que velado). Como na nossa empreitada sobre publicidade, a ideia aqui foi apenas ouvir histórias e depoimentos (que foram postados nas nossas redes sociais ao longo do mês e, agora, compilados aqui) como um grande aprendizado. Dar voz, celebrar as diferenças e, sobretudo, conhecer GENTES.

Mohamed, 34 anos, pedreiro Serra Leoa

“Estou no processo de tirar a documentação para ter o Brasil como segunda cidadania.” “Eu gosto muito de São Paulo, estou aqui há 1 ano e 2 meses, e nunca tive problemas com ninguém. Sou pedreiro, trabalho em obras. No começo foi difícil encontrar trabalho, mas agora estou mais tranquilo. Estou fugindo do Ebola. A doença acometeu muita gente da minha família, é um problema muito grave no meu país. O Brasil é um país bom, não tem guerra, as pessoas são boas.”

Diop, 60 anos, estilista Senegal

*Já fez figurino para Elza Soares, Liniker, a miss Brasil Raissa Santana, entre outros. “Estou em São Paulo há 10 anos e não dá para dizer que não existe preconceito no Brasil. Você pode chegar com diploma, mas dificilmente vai conseguir trabalhar na área.”   Todo mundo da África para mim é irmão, gosto de acolher e de ajudar, é coisa do coração. Quando vejo os meninos indo se drogar, sou eu quem cuido, levo para o hospital. Meu último aniversário passei com moradores de rua, pra mim todo mundo é igual.”

Quem: Cheikh, 41 anos, estilista Senegal

“Estou no Brasil há 1 ano e 2 meses. Vim pra cá porque a situação econômica no meu país está muito difícil. Além disso, gosto do clima tropical daqui, das ruas, das pessoas…aqui não tem guerra. Trago a minha cultura através das minhas criações: faço vestidos, saias e turbantes com estampas do Senegal.”    

Julio, 28 anos, ajudante de cozinha Peru

  “Estou no Brasil há 5 anos. Tenho muitos amigos em São Paulo que sempre me falavam o quanto o país era bom e receptivo, por isso quis vir pra cá. Pretendo me estabelecer por aqui, mas também sinto saudades do Peru. Temos uma comida deliciosa, praias lindas e cidades históricas que merecem a visita, como Machu Picchu”.  

Eugene (31 anos, há 2 no Brasil), Yannick (28 anos, há 5 meses no Brasil) e Placide (33 anos, há 8 no Brasil). Camarões

Placide: “Camarões é um país pequeno, com 20 milhões de habitantes e 279 dialetos. É uma nação potencialmente rica, mas que sofre muito com a geopolítica mundial. Pra você ter uma ideia, quase 30% da população não tem acesso à eletricidade e água tratada, e a desigualdade social lá é maior que no Brasil. Os brasileiros são acolhedores mas, pra ser sincero, aqui tem muito preconceito racial, e te digo isso porque senti na pele, no lugar em que eu trabalhava [uma empresa de tecnologia], foi isso o que me fez sair de lá. O Brasil tem a ideia de que a África é uma só, mas somos um continente com 54 países, com culturas e histórias diferentes”.       Eugene: “Estou há 2 anos no Brasil e curso letras na UNIP, quero ser tradutor e intérprete. No nosso país falamos inglês e francês, e ainda aprendemos uma terceira língua na escola. Cada região de Camarões tem sua cultura, é um país muito rico e bom para se viver. No entanto, não temos muita gente escolarizada e vivemos em uma situação de subemprego: você se forma e não tem trabalho na sua área. Cheguei aqui sem saber falar português, mas fiz um curso e aprendi a me comunicar. Agora estou procurando emprego.”

Jeremy, 25 anos, garçom Congo

      “Saí do meu país porque estava sendo perseguido pelo Estado, estavam tirando a minha liberdade de expressão. Eu era membro  da UDEPS (em francês: Union pour la Démocratie et le Progrès Social – União pela democracia e progresso social, um dos maiores partidos políticos da República Democrática do Congo) e estudava Mecânica na universidade. É importante lutar pelos nossos direitos, não é? Vim para o Brasil porque o visto saiu mais rápido.”

Alexandre, 44 anos, dono de restaurante Líbano

    “Vim sozinho para fazer minha vida no Brasil. Cada um de nós da região do Oriente Médio temos um sonho a realizar. Lá tem muita guerra, eu não tinha futuro. Certo dia, uma tia minha minha que morava em Foz do Iguaçu falou para o meu pai mandar alguém da família para ajudar nos negócios dela. Vim e fiquei. Acabei de me naturalizar recentemente e estou muito bem, graças ao povo brasileiro. A violência é grande, corremos o risco de sermos assaltados, mas nada comparado ao perigo de se viver no Líbano.”