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matilda — 8 de agosto de 2018

DO PALCO PARA A VIDA: ARETHA SADICK

Definir alguém pode parecer algo fácil numa primeira análise pouco detida. Idade, origem, cor, sexualidade, trabalho. Pronto, com alguns ingredientes temos uma pessoa feita. Realmente seria algo fácil, se fosse verdade, mas poucas pessoas (ou talvez nenhuma) podem resumir toda sua existência em elementos tão parciais, por mais essenciais que eles sejam. É preciso conhecer sua história, é preciso ouvir a sua voz, é preciso ver o que desperta o seu sorriso ou ódio. As ações nos definem mais do que o nosso próprio corpo, foi o que pudemos aprender com Aretha Sadick em uma rápida entrevista feita em sua casa em São Paulo.

Dos palcos para a vida

  Morando na capital paulista há três anos, Aretha transita entre diversas áreas do universo das artes, trabalhando atualmente sob três pilares: performance, música e moda. “Eu uso essas três plataformas para falar do meu trabalho, para falar das minhas questões, para apresentar os meus pensamentos a respeito dos recortes de gênero, sexualidade e raça”.    O início da sua carreira se deu em 2011 com o concurso “Miss Gay”, no Rio de Janeiro, do qual a artista saiu vencedora apresentando pela primeira vez a sua então persona drag, Aretha Sadick. Sua formação com o teatro na Martins Pena já havia lhe proporcionado experiências com o feminino a partir dos atores que naquele momento começavam cada vez mais a interpretar papéis destinados às mulheres.    Trazendo a experiência dos palcos para a vida, hoje a persona drag criada para o concurso é sua identidade em tempo integral, assumindo no dia a dia o lugar reservado ao feminino e abrindo mão dos antigos privilégios masculinos. “Nesses últimos três anos que eu estou em São Paulo, eu fui me permitindo viver isso, fui me permitindo experienciar esse lugar dessa minha feminilidade de viver e enxergar, cada vez mais, o mundo a partir de uma perspectiva que não é masculina, definitivamente.”    

A arte da transformação

Seja nos desfiles de moda ou em suas performances artísticas, Aretha sempre busca imprimir sua visão da arte como ferramenta de educação e transformação, trazendo sua vivência, seu corpo, seu gênero e sua cor como elementos que quebram com os padrões instituídos. Seus desfiles na Casa de Criadores são um exemplo disso.     “A gente sempre teve um caminho só enquanto pessoa negra, que a sociedade colocou a gente e eu vou sempre bater nessa tecla. ‘Não, olha aí gato, a gente pode entregar três performances diferentes, dentro de uma mesma semana de moda, contar três histórias completamente diferentes, sendo a mesma pessoa’.”     No campo da música, Aretha possui um trabalho no qual interpreta as músicas de Grace Jones, cantora que tem como referência, além de um trabalho autoral ligado com a música eletrônica com o produtor musical Adalu da coletividade.NÁMÍBIÀ, rede de artistas negros e negras que se apoiam entre si. “Esse trabalho é um trabalho de resgate da importância da comunidade negra na construção da música eletrônica que embranqueceu-se. Por exemplo, tem o soul train, tem a galera de Chicago, tem a galera do vogue, toda a galera que construiu as bases da música eletrônica negra e que foram deixados para trás e os nomes foram apagados. Então, dentro da NÁMÍBIÀ o meu trabalho basicamente é esse, de fazer esse resgate.”     

Afrofuturismo

Recentemente Aretha participou da filmagem do ainda inédito NEGRUM3, filme de Diego Paulino que de forma artística e imagética trabalha o tema do Afrofuturismo, dialogando com a visão da arte como ferramenta de questionamento e transformação social ao levantar a pergunta “Para onde a comunidade negra está caminhando?”. “Acho que é extremamente importante a gente ter essas imagens, principalmente quando a gente entende o lugar do audiovisual, o quanto o audiovisual é branco e cis, então é sobre a história de que nós possamos contar as nossas próprias histórias.” No vídeo, Aretha Sadick fala um pouco mais sobre sua arte e o resgate da cultura e história do povo negro: